domingo, 18 de novembro de 2012

Viver para Morrer / Morrer para Viver

"O que importa é estar vivo antes de morrer".

A frase é do filme (recomendadíssimo) 'Depois de Partir', com Romain Duris e (ele, O ator) John Malkovich.

Viver é prazeroso.
Ser é prazeroso.
E ter consciência disso é mais prazeroso ainda.

A cada dia morremos em horas, em minutos e segundos.
Matamos oportunidades.
Sufocamos desejos.

A cada dia nascemos em horas, em minutos e segundos.
Damos à luz oportunidades.
Respiramos desejos.

Velhas pegadas se apagam.
Estradas cruas em sombras percorremos.
Pneus derrapam na ausência de faróis.

Novas pegadas se imprimem.
Estradas bem pavimentadas percorremos.
Pneus seguem os ritmos na batuta da luz.

Morrer, em seu sentido metafórico, pode ser (e é) prazeroso.
A metáfora ainda persiste quando insinuo a morte como o findar de um capítulo, de uma página.
É preciso morrer para viver.
Figurativamente a morte é fiel ao desenvolvimento da vida.
Sem qualquer intenção cacófona, pleonástica ou paradoxal, viver a vida é também morrê-la aos poucos.

E o que é a morte real?
Um fim, um ponto final.
Não, uma exclamação!
Um espanto necessário.
Uma pausa, mas com reticências...

Em meio à reflexão, sem me alongar, afasto-me de religiosidades.
Pretendo apenas pisar observando caminhos.
Na estrada que me leva a momentos tão repetidamente reflexivos.
Como num livro de autoajuda.
Mas o que é a nossa vida, mais precisamente o nosso dia, senão uma frase, um parágrafo, ou até um capítulo?

Vírgulas são imprescindíveis. Muitas das vezes as ignoramos. Só ponto. Ponto. E ponto.
São tantas as regras, tantos os conhecimentos a serem postos em prática.
Tantas revisões a serem feitas.
E quem disse que não podemos revisar a vida?

Revisá-la é sempre preciso.
Mas não se fixe às regras.
Observe as exceções.
Monte neologismos.
E deixe os acadêmicos se esgoelarem pelo cumprimento das leis gramaticais.

Afinal, é preciso também matar algumas regras para se viver.

Visto que antes de morrer (em carne) é preciso viver (em pele, osso e alma).

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Consulta médica (sobre o fim dos tempos?)

Endie: Doutor, ando muito arretada com muita coisa ao meu redor.

Médico: O que exatamente, minha filha?

Endie: Ah, sabe, o mundo não é tão legal assim quando a gente se aproxima mais dele.

Médico: Explique melhor.

Endie: Não consigo acreditar no fato de que a minha felicidade ou até minha simpatia podem afetar pessoas ao meu redor de tal maneira que passam a querer, a qualquer custo, me tirar de um pedestal no qual eles próprios me colocaram.

Médico: Hum

Endie: E eu nem gosto de alturas, doutor!

Médico: E esses 1,74m?

Endie: Ah, dessa altura eu nunca abri mão. Sabe como é: pra sustentar essa moça aqui, cheia de criatividade, otimismo (tá se rachando, mas não se esvairá nunca!), simpatia e autoconfiança, menos do que 1,74m não seria suficiente.

Médico: Eis uma verdade.

Endie: Mas, doutor, qual a prescrição médica pra minhas desilusões neste mundo de meu Deus?

Médico: Minha filha, a solução não é fácil. Afinal, remédio para não passar por decepções ainda não existe. Mas, pra você, tenho uma receita perfeita.

Endie: Qual?

Médico: Música! Muita música boa e de qualidade. Ah, mas só funcionará com uma condição.

Endie: ... [cara de espera, com as sombrancelhas arqueadas]

Médico: Só se você cantá-las. Aí seu coração vai ter uma dose de recarga suficiente para aguentar mais trancos da vida.

Endie: Poxa, muito obrigada, doutor. E quanto lhe devo pela consulta?

Médico: Uma canção.

E ela cantou "Somewhere only we know" com a alma meio capenga, mas com o coração renovado após se energizar com o poder da música.

sexta-feira, 2 de novembro de 2012

27 anos

Meu olho esquerdo vibra.
O lado direito do pescoço dói.
A mão direita desequilibra.

A respiração ofega.
Os poros umedecem.
A paciência não releva.

A insatisfação cresce.
Sonhos se vão.
Esperança esvanece.

O vento seco procura esfriar
O coração ferido que tenta buscar
Saída na umidade relativa do ar.

Ar que procuro sorver
Mas a força se faz trêmula
E renovação de energia ousa nascer.

Em minhas veias pulsam alegrias.
Tento encontrá-las a fim de dissipar
Decepções que tentam meu otimismo castrar.

Músicas são remédios para a alma
Há 27 anos empreendendo ritmos
Em sua maioria afinados, mas por vezes sem quase calma.

Salvando-me das quedas bruscas
De topadas e arranhões
Que por ventura meu brilho ofusca.

Mas o mundo não é o mesmo
A percepção cada vez mais rígida
Faz a encantadora carregar seu peso.

Quilos de intolerância com vazios
Que se multiplicam em meus caminhos
Desertos, por vezes, de samaritanismos.

O amor almejado nem quer aparecer
Apenas aquele de família
Sim, é claro, pelo qual tenho muito a agradecer.

Insatisfações tomam conta de parte do corpo
Longe de ser perfeito, mas com grande recheio de bondade
E sem qualquer moralismo torto.

A voz mais madura muitos agudos quer soltar
Solando nessa vida nunca fácil de lidar
Mas sei que ouvidos prontos para ouvi-la vou encontrar.