sábado, 7 de novembro de 2015

Galeria francesa

Créteil (França) - um dos cenários que inspirou o texto abaixo

Há alguns dias, honrei minha presença, pela terceira vez, no lugar ao qual pertencem meu coração e minha segurança musical. Tão logo o freio de pouso sublimou minha paixão aguçada pela luz de lembranças terrenamente inexplicáveis, o cansaço das quase 14 horas de trânsito aéreo esvaiu-se como num despertar de um sono doce e profundo.

Dali para os próximos 15 dias, houve aventuras previstas, mas nada tão estritamente calculadas. E mesmo diante de vai e vens de novas lembranças a se formar, em cenários diferentes de vistas anteriores, minh'alma ratificou o desejo de regressar sempre àquela que me energiza e me faz preencher rios internos de esperanças.

Por entre as caminhadas apaixonantes, mesmo no fluxo constante das agitações urbanas, a paz lembrava de aparecer e de sorrir. Dentre olhares sublimados de encantamentos, o meu encontrou uma citação constante que resumiu a ópera da minha passagem: "Decidi ser feliz porque é bom para a saúde". Com base em Voltaire ou não, a decisão já estava constatada e devidamente atestada.

Sorrisos bobos sibilavam de quando em vez às paisagens que passara a conhecer (com a segurança interna de um futuro retorno) e que outrora presenciara. Outrora atual e pregresso, muito pregresso, para além do estado físico, e talvez racional. O reconhecimento da vida atual se situou em constantes atestados de magia saudosa que me esclareceram a dúvida a qual, por ventura, ainda poderia pairar. Meu coração não pertence senão àqueles fragmentos constantes de alegria, luz e amor à natureza (que parece nos brindar, orquestralmente, com notas musicais constantes, em harmonias únicas).

Se a concepção de amor perfeito existir, a minha está lá, repousando em lembranças passadas e expectativas futuras, sempre à espera de sensações de completo desprendimento terreno. E se a felicidade é uma galeria de quadros pintados e ainda por preencher, meu marchand tem um gosto muito especial de persistir em me apresentar paisagens que j'aime. Et comme je les aime!  

quinta-feira, 2 de julho de 2015

Sociedade autofágica

Van Diemen's land (U2): trilha sonora do texto.

Ser egoísta parte de princípios diferentes, de interpretações, muitas vezes, convenientes. Cuidar-se de si mesma (com pleonasmo exagerado) é egoísmo quando saímos da expectativa do outro. E o outro tem bastante expectativa com todos. A vida é feita disso, né? O desafio é nos livrarmos dessa teia venenosa de dependências emocionais. Porque tudo é levado para o lado emocional. É mais fácil seguir na onda dos incorretos do que contestá-los. 

E, desse jeito, a sociedade vai se adoentando e alimentando uma fome de infelicidades. Sociedade autofágica, tenho dito. 

O que leva alguém ao ciclo vicioso da má conduta? Caos? Caô? Cacos de uma vida miserável? E de qual miséria se devaneia? Política? Melódica? Imaginativa? Vingativa? Por entre os números de violência intrafegantes se delineia a desesperança de uma sociedade de valores flácidos. E não há botox, nem silicones que deem jeito a atitudes pérfidas e necromantes.

Se conhecerem alguns discípulos de Dr. Ivo Pitanguy das atitudes reais, por favor, não hesitem em indicá-los para a nossa sociedade. Quem sabe não ajudam a harmonizar um pouco esse turbulento cenário de guerras emocional e civil.


Meu grito

"Where the streets have no name" (U2): o meu grito em forma de música.

Meus músculos já não se contraem como antigamente. Daquelas contrações que despertam calafrios de esperança. Meus calafrios doem. Incomodam. E me fazem querer gritar forte. Com peito estufado e com uma voz grave que nem sabia, até há pouco tempo, que existia.

Minha fraqueza não reside em ver infelicidades, mas em me ver pessimista, com toques constantes de angústia e desapontamentos. Minha voz não se encaixa mais com os tons de outrora. 

Se costumava dar pulos constantes, hoje pulo situações da minha vida como quem pula canais de tv. Se gargalhava com qualquer ação, hoje inativa essa habilidade está. Se acreditava que a música poderia ser capaz de agregar pessoas de valores especiais, hoje caio na real. 

Sinto falta do tempo em que acreditava que ter uma rotina poderia ser algo bom. Mas a minha rotina me desgasta a ponto de rasgar meus nervos. Nervos que antes pareciam ser feitos de aço, desfiam-se em tiras cada vez mais frias de cor. O colorido dá lugar ao cinza sem graça.

Pessoas machucam. Constantemente. Pessoas violam outras pessoas. Reiteradamente. Pessoas se prestam a papéis de algozes dos seres que elas mais temem e desempenham isso magistralmente. 

O ar interno pesado ainda carrega gotículas de fôlego. Grito como quem merece liberdade de ser mais feliz. Liberto notas de grave que gravemente me fazem querer subir colinas, explorar desertos, afastar-me da escuridão e envenenar partículas de desumanidades espalhadas pelo mundo ao redor.

Quero correr. Cansei-me de deslizar sobre terrenos fracos e vazios. Esse caminho não merece os meus pés. Depois de quase 30 anos, aprendi que sou mais do que o que querem que eu seja. Sou mais do que me vejo. Eu grito, e meu grito atinge a alma que havia esquecido de despertar. A minha própria alma.

quinta-feira, 21 de maio de 2015

Meros menos humanos

Gritos constantes, raivas desconcertantes
Vísceras expostas, cuspes de sangue
Turbilhão de ideias desorganizadas
De quê adiantam?
Para quê tão frequentemente se adiantam?

Das etiquetas de grife que clamam por atenção
Às falhas humanas que se expõem
Sem risco de se desafortunarem
Ganham sentido de bons valores
Pura ilusão!

De destruição em destruição
Agressão em agressão
Sinto a pena sangrar
Em cada palavra a desgarrar da mente
Que mente para não lacrimejar

Enquanto corações amam dilacerar
Cérebros cercam a próxima vítima
Sem piedade, torcem por serem temidos
Odiados, odiosos e apodrecidos
Em marcha robótica a um futuro presente insuportável

Na terra que outrora brotava flor
Dor de fato passo a carregar

E mesmo que o fruto escasso do amor
Se desfaça em mil pedaços em meio ao chão
Sem adubo certo
Ou sem boa iluminação
Rezo, peço, penso
Que bom que tal mal
Tal pesado e cortante mal
Não atingiu a todos

Apenas aos muitos tolos
Que pensam serem mais que humanos
Quando, de fato, são menos humanos
Meros menos humanos
Cada vez mais, menos humanos

domingo, 10 de maio de 2015

Homenagem às canções (ou O desejo de aventuras e fartas emoções)

Canções
Tais provas de vivacidade
Pedem apenas ouvidos levemente atentos
Enquanto nos herdam horas, dias e memórias
Sempre prontas a nos despertar

Os sentimentos que se sacrificam por elas
Valem tanto a pena quanto a pena que rabisca lembranças carregadas
Por anos, séculos, milênios de paradoxo emocional
Tais notas em maior ou menor, em sustenido ou bemol
Sétimas, quintas e oitavadas
Que nos fazem carregar fardos
Ou abraços imaginários
Beijos vívidos
Lágrimas a causarem curtos circuitos internos
Nos levando, relevando e nos entregando a paixões
Imaginadas, vividas, cantadas
Postas em figuras aparentemente abstratas
Daquelas que sobem, pausam e descem
Em partituras ou cifras
Tentativas, enfim, de organizar aquilo que nos denuncia
Pelo sorriso tentado a se esconder
Pela maré ocular a escorrer
Pelo brilho eterno de se projetar numa canção

Em um mundo de sangue, carne, força e poder
Esquecemos da liberdade de escolher ser
Apenas por instantes
Preciosos instantes
Amantes, amigos,
Pais e filhos,
Pedras de gelo,
Mármores gelados,
Corações livres ou apertados,
Sorridentes ou careados,
Com direito a reincidências futuras

Afinal, para quê servem as canções
se não para serem repetidas até se impregnarem
em nossas hemácias, nervos ou leucócitos?
De sorrir ou de chorar
De pensar ou respirar
Canções podem nem ser soluções
Mas certamente nos herdam boas aventuras, fartas emoções


Um álbum que me despertou coragem a escrever o texto acima. 
Porque meus melhores estalos mentais vêm através de canções.
Stages, álbum recém-lançado, fez lembrar-me de uma das minhas maiores
inspirações como cantora: canções de musicais. 

domingo, 22 de fevereiro de 2015

Cupcakes da discórdia

Sugestão de trilha sonora: versão de Somewhere only we know (do Keane), com Carrie Mac

Das coisas que vivi, lembro-me mais dos sorrisos que das quedas. Ando numa fase mais fechada para balanços positivos. Quem e o quê devem me interessar são as respostas que me preservam neurônios e não as que os queimam. Porém, a tarefa é árdua e incômoda. Pinçar espinhos fere e deixa arranhões. Falo do meu passado, meu presente e perspectivas futuras.

Não sei se contar pormenores vale a pena. Creio que não. Entretanto, exemplificar, mesmo que genericamente, facilita a compreensão do que vos falo.

Perguntaram-me, durante a semana, se tenho paciência para as pessoas cujo letramento está em nível bem desvantajoso em relação aos presentes na conversa. Minha resposta foi um sorriso. Afinal, pensei comigo, por que não teria paciência com quem precisa de ajuda e tem escassas condições sociais? 

Gosto de pessoas. Sobretudo das que prestam atenção no que falo e que me permitem escutá-la sem qualquer vínculo de avaliação constante e recíproca. Inclusive, neste meu blog, já falei em meu vício (impulso? mania, talvez? Não encontrei palavra que defina) em ser útil. Sobretudo, socialmente falando. 

Não frequento igrejas. Não gosto de me sentir presa a certas obrigações e proselitismos. Sem falsos moralismos, ok? E nem desrespeito quem o faz. Apenas uma escolha pessoal. Mas, apesar disso, aprendi, durante a caminhada, que me faz falta ser mais Endie e menos automática. 

Quando as pessoas que me conhecem falam o meu nome (em geral, tá? Não dá para ser unânime!), elas sorriem. Porque é isso o que, normalmente, transmito: sentimento bom. Autopromoção? Não. Reconhecimento de que meus anos de dedicação ao ato de ser mais humana, do desconhecido ao familiar, seguem valendo a pena.

Valores do bem estão enraizados em mim. Sejam eles cristãos, budistas, ou qualquer outra nomenclatura na qual acreditem. O que me importa, mesmo mesmo, é poder deitar minha cabeça no travesseiro todas as noites (ou na maioria delas) e dormir sem aquela sensação de que estou prejudicando alguém. 

Pegando carona nesse raciocínio, ratifico a ideia de que pessoas e suas histórias me atraem. Adoro escutar. Prestar atenção e dar feedbacks (sejam de sorrisos, palavras ou apenas olhares). Apetece-me ser humana. Só que está difícil. Por quê? Vejamos.

Valores subnutridos estão circulando em nossa sociedade. Subnutridos de amor, saúde e bem-estar. Tem muita coisa errada, invertida e violenta por aí. 

Não gosto de modismos. Não curto assuntos do tipo "todo mundo está fazendo isso". Primeiro que minha mãe me ensinou que eu não sou todo mundo (aliás, sábias mães que nos ensinaram isso). Segundo que não me acrescenta ser mais uma em meio ao padrão da vez. Quero ser reconhecida pelo o que faço de bom (seja na música, no sorriso ou em algum tipo de ajuda), não pelo o que visto, calço, como ou pago.

O texto não é indireta pra alguém. É direta para os alguéns que habitam o mundo e se esquecem de que todos iremos parar debaixo da terrinha lá do cemitério (ou em outro lugar em que as cinzas forem jogadas). Então, para quê me ferir com ferros e fogos sociais? De que adianta o que não me acrescenta?

Das esquinas por onde passei, andei encontrando mais amarguras que saúde. Doentes ambulantes de razão sofrível me provocam a ser mais feliz. Como? Sem fórmulas! Apenas desfrutando das pequenezes que perdemos de vista quando nos entortamos em direção a satisfações alheias. Fácil escapar das armadilhas sociais? Nadinha! Difícil é conciliar saúde e doença em mesmo ambiente. Contaminar-se é coisa de piscar de olhos. 

Perceba-se mais humano e menos padronizado. Ninguém precisa encaixar sua grande massa em fôrma de cupcake. Experimente apreciar pessoas. Conheça o que gosta (de verdade, não aquilo que alguma celebridade disse) e apaixone-se pela criatura que habita a sua massa. É muito bom sorrir para si mesmo e saber-se capaz de coisas maiores do que a (nada sã) filosofia das mentes enlatadas podem querer.