Créteil - França (novembro/2015) |
Inquieta com a possibilidade de não escrever, quando tanto o desejava, ela começa a maquinar em suas engrenagens a ideia de uma construção que, de repente, reportasse a sua situação impeditiva. Uma tentativa de pôr a máquina encefálica para funcionar ou uma maneira de suprir a inevitabilidade de escrever? E nessa função metalinguística seguiu saciando o desejo da conquista impressa das palavras.
"Música!", pensou rapidamente. "Preciso de música!", bradou veementemente. Um jukebox veio ao seu encontro imaginativo e se mostrou um tanto quanto conflitivo. Afinal, como escolher uma entre tantas, recentes e antigas, para se inspirar a debulhar a fibra interna? Pedir-lhe para selecionar uma canção seria como requisitar-lhe uma eleição entre a alegria e a esperança. Assim, separadamente.
Foi então que percebeu que a plataforma que escolhera lhe conduzira a uma opção mais atrativa e mais atual, sobre a qual havia pensado recentemente. Ela versa sobre amor e expectativas (ok, dois pontos bem óbvios para uma escritora pensar a respeito). E sobre frustrações (mais uma obviedade narrativa). A voz marcante e meio rouca da cantora em junção com a melodia não apenas despertam o interesse do canto da Srtª Racioemocional mas igualmente o retorno de uma de suas pautas que havia escapado há pouco.
Então, eis que de repente ela se dá conta de que aquela ideia poderia lhe render mais parágrafos, mais caracteres e se estender por entre as nuvens mentais, trazendo de volta as outras ideias fugitivas. Entretanto, por que agora ela pensa em guardá-las para as próximas publicações? No fim das contas, não era exatamente esse o desejo quando firmara a sua longa estrutura na cadeira, preparou bem a almofada para lhe apoiar, encheu a garrafa de água, afastou alguns cachos da testa e respirou uma vez profundamente antes de começar a usar alguns dos seus 10 dedos para dar vida ao que estava, até então, pipocando em sua massa encefálica?
Não. Precisava reconhecer que naquele momento era suficiente projetar apenas os primeiros esboços do retorno mais frequente aos laços da escrita crônica. E ela reconhecia tanto essa suficiência que, antes que o fluxo do rio de inspirações em que navegava fizesse mais uma curva, a Srtª Racioemocional lançou a âncora (instrumento habitualmente não apreciado por ela), mergulhou os pés naquele pedaço de mangue criativo e virou-se para observar o caminho em que naquele breve momento percorrera. Foi então que sua coluna a fez curvar para frente, os ombros caíram para baixo, a expiração empurrou seu centro de gravidade para o meio e as pálpebras se movimentaram em ritmo mais lento. Só que, dessa vez, um sorriso a distraiu de um provável bloqueio criativo. E, ali, ela se viu em um cenário de uma singeleza feliz.
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